sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Escolhendo os frutos

Texto de Rute Sobrinho



Vivian olhou tudo ao redor. Conferiu os frutos, olhou todos os pés cuidadosamente. Receou fazer a opção errada novamente...

Da primeira vez que ela escolheu um fruto para saborear e para que ele fosse seu, escolheu rapidamente, a fruta deu-lhe água na boca. Mas não sabia até então que o fruto, depois de saboreado, passava a fazer parte dela. Pensou ingenuamente que nada lhe aconteceria. “Deus” não poderia ser injusto assim. Ele sabia que eu tinha andado muitos dias até aqui apenas com uma garrafa de água, pensou ela.

Ficou um bom tempo mal do estômago pelo que comeu. Traumatizada, demorou voltar a desejar outra fruta. Quando o fez, foi ao pomar, certa de que já aprendera a fazer escolhas corretas. Dentre tantas frutas com tantas características boas, escolheu a mais bonita, com um tom alaranjado encantador. Mas essa estava podre por dentro. A bela casca escondia muito bem seus odores e gosto azedo. De novo, pensou ela. Vou conviver com esse azedume em minha vida por um longo período. O gosto amargo não me sairá da boca tão cedo...

Desta última vez, no entanto, queria entender o processo de escolha. Qual o motivo de errar tanto. Saiu em busca de um entendimento maior. Como ouvira falar do oráculo, quis vê-lo. Mas onde procurar?  Quem era afinal? Começou indo às montanhas mais geladas, o barulho do vento uivava em seus ouvidos e nenhuma resposta houve. Decidiu ir a uma floresta tropical, com fauna e flora variadas. Nada. Seria no deserto? Sofreu no clima seco, areia no rosto, Sol escaldante e nada também.

Chegou a sua casa um tanto quanto decepcionada. Seria tão impossível querer uma orientação? Comeu alguma coisa, tomou um banho e dormiu profundamente. No outro dia acordou com um belo sorriso no rosto. Tinha a resposta que queria.

Enquanto seguia para o pomar do comprometimento, pensou em como as coisas eram mais simples do que pensava. O oráculo estava todo tempo com ela, mas na ânsia de encontra-lo fora de si, deixou de perceber a mensagem de suas próprias reflexões, mesmo que inconscientes.

Ao chegar à plantação resolveu não acreditar no seu sentido mais falho: a visão. Olhou rapidamente apenas para se localizar e fechou os olhos. Apalpou e cheirou todas as frutas. Pensou em como seria quando elas fizessem parte do seu mundo. Passou a dar importância às sensações sentidas: repugnância, paz, confiança, indiferença, aflição, desconfiança. Escolheu uma linda fruta, como a maioria das outras. Mas com uma diferença, conseguiria conviver com os fluidos vitais daquela fruta até o fim dos seus dias, e ainda ficar saciada e feliz.