segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Inadequada

By Rute Sobrinho

Ninguém entendia como aquela moça de vinte e cinco anos ainda não havia aprendido códigos básicos para um convívio em sociedade. Não sei como é que alguém nasce com tamanho defeito de personalidade e se cria - dizia sua avó.
Em determinada época seus pais chegaram a propor um tratamento de “adequação social” para que ela não fosse tão inconveniente nos jantares e encontros. Imagine só a cara dos pais, desgostosos... Afinal, foram anos investidos em boas escolas, faculdades, aulas de etiqueta, pra nada. Mas depois desistiram, tinham medo de piorar a situação e perder seu tesouro mais precioso.
Ela não havia aprendido, por exemplo, a concordar com os outros só pra agradar. Como sempre foi muito educada, sabia respeitar, mas nunca se furtava em dizer qual o seu ponto de vista. Esperava que existisse consideração mútua e sentia-se ofendida com as palavras contundentes e afiadas de que era vítima.
As coisas ficavam ainda piores quando expressamente lhe pediam a opinião. Ela definitivamente não conseguia entender que as pessoas já possuíam uma avaliação clara sobre o assunto e só queriam uma aprovação. Mas ela, com esse problema seriíssimo, era desprovida dessa percepção. E logo começava a explanar sobre os prós e contras e sua visão sobre o assunto, alertando, ainda, dos perigos da tomada de algumas decisões.  Mas depois via a decepção estampada no rosto do ouvinte e ela não entendia por quê...
Não aprendeu a se fazer de coitada diante das negativas da vida ou quando seus planos eram frustrados. Ao invés disso, pensava em como traçar outra rota. Mas em sendo assim tão positiva com a vida, faltava-lhe o afeto comumente dispensado aos que sofrem. Ela não era digna de pena, todos a tinham por metida e insuportavelmente autossuficiente.
Já os pais viam-na com outras lentes, coloridas e suaves. Entendiam que ela era um vaso de cristal, podia-se ver tudo que estava dentro, mas também era frágil.
E o mais grave, não desistiu de acreditar no amor sincero, mesmo sabendo que ele era caro e raro para os seus parcos recursos. Via muitos gabarem-se de viver um grande amor, mas tudo não passava de conveniências e costume, e isso ela via claramente, não adiantava dissimular. Mesmo com os contratempos, ela não queria um bem querer assim não, queria-o de verdade e intenso. Tinha uma força e uma certeza contrastantes com sua delicadeza de alma. Iria até o fim, com a sua teimosia importuna.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Você pode deixar seu comentário sobre os textos, opinião sobre o blog ou sugestão.