domingo, 12 de maio de 2013

Sonhos

Texto de Rute Rodrigues Sobrinho


Quando eu era criança sabia voar. Era um vôo sem asas, sem vento para atrapalhar. Era um movimento gostoso, tão sutil que não havia frio na barriga. Eu sobrevoava uns bosques, porque não chegava a ser uma floresta, e via tudo lá de cima.

Quando acordava contava que passei a noite voando igual aos pássaros, mas melhor ainda que eles, porque eu voava sem ter asas. Fui crescendo e vendo que as pessoas não podiam voar, só os pássaros e, além do mais, eu não tinha asas...

Quando comecei a questionar os meus sonhos, que deveriam ser inquestionáveis, passei a voar mais baixo, a poucos metros do chão. E o pouso era desagradável, como se eu estivesse fazendo algo errado que não era pra mim, mas que deu certo aquela vez. Eu estava cada vez mais grudada no chão.

O tempo foi passando e os meus sonhos mudaram, passei a levantar pouco do chão, sentia medo e logo voltava a colocar os pezinhos na terra. Aquela sensação boa quase não existia mais, porque eu tinha medo de cair e estava conhecendo a realidade do mundo.

Anos mais tarde continuei a sonhar com meus vôos, mas eu sempre caía num buraco sem fim, acordava com o coração batendo muito forte, quase saindo pela boca. Se eu soubesse voar ou acreditasse que podia voar certamente esses sonhos não me incomodariam. 

Achamos que somos livres na maioridade ou quando temos independência econômica. Na verdade nascemos livres e somos aprisionados aos poucos quase sem perceber.

Começamos a vida sem preconceitos, com todas as possibilidades pela frente. Mas aí crescemos e acreditamos no que os adultos dizem. Coitados, eles apenas propagam a decepção que também tiveram um dia...

Vamos assimilando esses conhecimentos, nossos sonhos vão diminuindo, nossos vôos ficando mais rasos, até o dia que em andamos apenas com nossos pés. 

Mas sonho é sempre sonho, tudo é possível. Podemos ter duas cabeças, voar com três asas, ter rodas nos pés e andar igual carro, ter qualquer profissão, fazer tudo o que quisermos. 

A nossa verdadeira maioridade é inadmitir que alguém zombe dos nossos sonhos, que nos convençam que algo não é possível, que nos tirem o gostinho de vôos altos e maravilhosos. 

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